A linguagem que os físicos usam para descrever a natureza é a Matemática.
Em particular, a área das Equações Diferenciais é extremamente útil para representar as leis que regem a evolução de sistemas.
Aqui apresentamos alguns conceitos matemáticos essenciais para o estudo rigoroso destes problemas.
Derivadas¶
- Funções são objetos matemáticos que consistem numa regra que associa elementos de um conjunto A a elementos de um conjunto B; Estamos interessados em funções que transformam números reais em números reais de modo a descrever a evolução de grandezas físicas como o comprimento de uma mola em função do tempo $L(t)$;
Limites de funções são o conceito básico da Análise Matemática. Dizemos que uma função $f(x)$ tem limite $L$ quando $x$ tende para $a$ ($x \rightarrow a$), se o valor da função pode ser arbitrariamente próximo de $L$ em pontos $x$ suficientemente próximo de $a$.
Derivadas de funções num ponto são dadas pelo limite da razão incremental:
$f'(x_0) = \lim_{x\rightarrow x_0} \frac{f(x)-f(x_0)}{x-x_0} = \lim_{h\rightarrow0} \frac{f(x_0+h)-f(x)}{h} $
Se este limite existir a função diz-se diferenciável no ponto.
Pela definição de limite, quando estamos suficientemente próximos do ponto $x_0$, o valor de $\frac{\Delta f}{\Delta x} = \frac{f(x)-f(x_0)}{x-x_0}$ é próximo de um número $m = f'(x_0)$, que é a derivada da função no ponto. Desta forma, para indicar que estamos a considerar o limite desta razão para pequenos intervalos, utilizamos também a seguinte notação para as derivadas:
$f'(x_0) = \frac{df}{dx}(x_0)$
Então, perto de um ponto diferenciável temos $\Delta f \approx m \times \Delta x \;\Longleftrightarrow$ $ f(x) \approx f(x_0) + m \times (x-x_0)$, ou seja, a função é aproximadamente linear (uma reta), com declive dado pela derivada no ponto.
Derivadas de ordem superior pode ser definidas como derivadas das derivadas:
$f'' = \frac{d^2 f}{dx^2} = \frac{d}{dx} \frac{d}{dx} f $
Propriedades das Derivadas:
Linearidade: $\frac{d(a\cdot f(x)+b\cdot g(x))}{dx} = a\frac{df(x)}{dx} + b\frac{dg(x)}{dx} $
Derivada do produto: $\frac{d(f(x)\cdot g(x))}{dx} = f(x) \frac{dg(x)}{dx} + g(x) \frac{df(x)}{dx}$
Derivada da razão: $\frac{d(f(x) / g(x))}{dx} = \frac{f'(x)\cdot g(x) - g'(x)\cdot f(x)}{g^2(x)}$
Derivada da função composta: $\frac{d F(u(x))}{dx}(x) = \frac{dF}{du} (u(x)) \cdot \frac{du}{dx}(x)$
Exemplos de Derivadas
- $\frac{d}{dx} (a) = 0$
- $\frac{d}{dx} (ax) = a$
- $\frac{d}{dx} (ax^2) = 2ax$
- $\frac{d}{dx} (ax^n) = a\cdot n \cdot x^{n-1}$
- $\frac{d}{dx} (sin(kx)) = k\cdot cos(kx)$
- $\frac{d}{dx} (cos(kx)) = -k\cdot sin(kx)$
- $\frac{d}{dx} (exp(x)) = exp(x)$
- $\frac{d}{dx} (ln(x)) = \frac{1}{x}$
Equações Diferenciais¶
Uma equação consiste numa igualdade que envolve incógnitas que queremos determinar.
Por exemplo, $ x^2 - 3x +2 = 0$ tem como soluções: $x=1$ e $x=2$, os valores que tornam a igualdade verdadeira.
Chamamos Equação Diferencial a uma igualdade entre funções que envolve derivadas, e em que o objetivo é encontrar a função que satisfaça. Por exemplo:
- $f'(x) = 2f(x)$
- $f''(x) + 7f'(x) + \dfrac{1}{3}f(x) = 4$
- $f''(x) \times f'(x) = 2x$
Estas equações tendem a tornar-se muito complicadas, muito rapidamente, sendo geralmente difícil, ou mesmo impossível, encontrar a solução, à exceção de alguns casos conhecidos. É precisamente aqui que entra a utilidade das ferramentas computacionais.
Equações diferenciais como as anteriores tratam funções que dependem de uma só variável $x$, sendo designadas por Equações Diferenciais Ordinárias (EDO's).
Para funções que dependem de múltiplas variáveis (como a posição $x$ e o tempo $t\; \rightarrow\; f(x,t)$), podemos ter equações que envolvam derivadas em ordem a diferentes variáveis, chamadas Equações Diferenciais Parciais (EDP'S), como por exemplo:
- $\dfrac{df}{dt} = \dfrac{d^2f}{dx^2}$
Derivadas em ordem ao tempo são também representadas com um ponto sobre a função:
- $\frac{df}{dt} = \dot{f}, \quad \frac{d^2f}{dt^2} = \ddot{f}, \quad ... $
Leis de Newton¶
Finalmente olhamos para como descrever a natureza usando estes conceitos.
Vamos considerar o problema do movimento de um corpo de massa $m$. A sua posição pode variar no tempo, sendo uma função vetorial $\vec{r}(t)$ - que na verdade são 3 funções $x(t)$, $y(t)$ e $z(t)$. Este corpo pode ser uma bola a cair devido à atração gravítica da Terra, a própria Terra a mover-se em torno do Sol, ou numa escala mais pequena, um átomo a colidir com outros átomos.
A primeira descrição das leis que determinam estes movimentos foi dada por Newton, e é escrita na forma de uma equação diferencial. Durante mais de 200 anos, esta foi a única descrição que tínhamos da natureza. Há cerca de um século, descobrimos que ela se comporta de maneira diferente, quer quando olhamos para coisas muito pequenas, como o movimento de átomos, quer quando olhamos para coisas muito grandes, como o movimento de planetas e estrelas. Em cada um destes casos surgiram novas teorias, não havendo ainda um conjunto de leis que funcione em todas as dimensões.
Contudo, à escala do ser humano, as leis de Newton fornecem uma descrição praticamente exata da realidade e é para estas que vamos olhar.
Leis de Newton¶
Existem várias maneiras de descrever a Mecânica Clássica (Newtoniana). Newton descreveu a interação entre corpos através de Forças. De forma geral, a força aplicada num corpo é um vetor que pode depender da sua posição, velocidade, e do tempo $F(\vec{r},\vec{v},t)$.
A velocidade e aceleração de um corpo são definidas como a 1ª e 2ª derivadas em ordem ao tempo da posição:
$\vec{v} = \frac{d\vec{r}}{dt}\;\;$ e $\;\;\vec{a} = \frac{d\vec{v}}{dt} = \frac{d^2\vec{r}}{dt^2} $
Definimos ainda o momento linear (quantidade de movimento) do corpo como o produto da massa pela velocidade $\vec{p} = m\vec{v}$.
A 2ª Lei de Newton é então a equação diferencial que determina o movimento do corpo:
$\quad \boxed{\vec{F} = \frac{d\vec{p}}{dt}}$
Normalmente a massa do corpo não varia e fica:
$\quad \vec{F}= m \vec{a} = m \ddot{\vec{r}}$
$ $ $ $
Exemplo - Movimento com força constante¶
Consideramos movimento a uma dimensão.
Se a força for constante $F$, a aceleração é também constante $a = F/m$. Neste caso as equações têm solução exata fácil:
$ \dot{v} = a \;\Longleftrightarrow\; v(t) = v_0 + at$
Onde $v_0$ é uma constante qualquer que vai corresponder à velocidade do corpo em $t=0$. Para a posição:
$\dot{x} = v \;\Longleftrightarrow\; x(t) = x_0 + v_0 t + \frac{1}{2}a t^2$
Onde $x_0$ é uma constante qualquer que vai corresponder à posição do corpo em $t=0$.
Aqui resolvemos uma equação de 1ª ordem (uma derivada) para a velocidade, e outra para a posição. Verificamos que em cada solução de 1ª ordem aparece uma constante que é determinada pelas condições iniciais do problema. A lei de Newton é uma equação de 2ª ordem ($\vec{F} = m\ddot{\vec{r}}$) (equivalente a duas equações de 1ª ordem), pelo que envolve sempre duas constantes dadas pela posição e velocidade iniciais do corpo.
A equação obtida aplica-se por exemplo à queda de corpos. A força gravítica é em geral mais complicada, mas junto à superfície da Terra é aproximadamente constante. Um corpo de massa $m$ é atraído para a Terra com:
$\vec{F_g} = -mg \vec{e_z}$
Verificamos que $a_z = F_z/m = -mg/m = -g$, independente da massa do corpo $-$ todos os corpos caem com a mesma aceleração, se não existirem outras forças como atrito no ar que os distingam. Nas direções $x$ e $y$ a força é nula pelo que $a_x = a_y = 0$. Então temos:
$x(t) = x_0 + v_{x0} t$
$y(t) = y_0 + v_{y0} t$
$z(t) = z_0 + v_{z0} t -\frac{1}{2}gt^2$
Método de Euler¶
Apesar do exemplo visto ter solução simples, isto não acontece para a maior parte dos problemas.
Consideremos como exemplo disto o mesmo problema, de atração gravítica para a Terra, mas para um corpo que está no espaço e cuja altura $z$ varia significativamente, pelo que a força não é constante. Segundo Newton, a força de gravítica é proporcional ao produto das massas dos corpos (neste caso a Terra e o corpo em queda), e inversamente proporcional ao quadrado da distância entre eles. Considerando apenas movimento na direção $z$, isto fica:
$F = m\ddot{z} = - \frac{GMm}{z^2} \;\Longrightarrow\;\; \ddot{z} = -\frac{GM}{z^2}$
Escrever uma expressão para a solução exata desta equação torna-se impossível. Ainda assim conseguimos imaginar como vai ser este movimento. Para pequenos intervalos de tempo, durantes os quais a altura muda pouco, o movimento vai ser aproximadamente o obtido anteriormente (com a aceleração $g$ correspondente à altura atual do corpo), mas à medida que o corpo se aproxima da Terra e $z$ varia muito essa atração aumenta.
Interessa por isso investigar como observar o movimento aproximado do corpo, para os casos em que a solução exata não está ao nosso alcance.
Aproximações¶
A maneira como podemos calcular aproximadamente o movimento do corpo é então notando que para pequenos intervalos do tempo, a força é aproximadamente constante. Desde que a força não varia descontinuamente (de um instante para o outro), é sempre possível escolher um tempo pequeno o suficiente tal que assim seja. Chamando a este intervalo $dt$, temos:
$\dot{v} = F/m \approx const. \;\Longrightarrow\;\;v(t+dt) \approx v(t) + F/m \cdot dt$
Da mesma maneira, a velocidade variou pouco durante este intervalo, pelo que:
$\dot{x} = v \approx const. \;\Longrightarrow\;\; x(t+dt) \approx x(t) +v\cdot dt $
Usando estas equações podemos determinar soluções aproximadas para os nossos problemas:
Método de Euler¶
Conhecendo as condições iniciais do nosso problema:
$\vec{r}(t=0) = \vec{r_0}$
$\vec{v}(t=0) = \vec{v_0}$
Escolhemos um intervalo de tempo pequeno o suficiente $dt$, e calculamos iterativamente, até alcançar o tempo desejado:
$\vec{v}(t+dt) = \vec{v}(t) + \vec{F}/m \cdot dt$
$\vec{r}(t+dt) = \vec{r}(t) + \vec{v} \cdot dt$
Escolhendo $dt$ cada vez mais pequeno a solução obtida deve tender para a solução exata, contudo aumenta o número de contas que temos de fazer.